A GAZETA DE ALGOL

"O morto do necrotério Guaron ressuscitou! Que medo!"

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Essa é uma revisão anterior do documento!


Autora: Neilast
Tradutor: Orakio Rob

Um barulho vindo do quarto de Rolf foi o que me despertou de um sono agitado e cansativo. Eu me sentei e abri meus olhos e percebi que ainda estava escuro em meu quarto. Eu sabia que devíamos estar no meio da noite. O relógio confirmou minhas suspeitas. Por um momento, eu fiquei lá sentada pensando se deveria ou não ver como estava Rolf. Eu não queria que ele, ou mesmo eu, se sentisse pouco à vontade, e não tinha cerrteza se ir até o quarto dele no meio da noite causaria isso ou não. Mas então me lembrei dos pesadelos que ele vinha tendo, e decidi que dar uma olhadinha seria a melhor coisa a fazer.

Saí da cama rapidamente, peguei meu roupão de carbono e calcei meus chinelos. Meu sentidos permitiam que eu encontrasse o que procurava e andasse rapidamente de um quarto para o outro sem esbarrar em nada. Mas então eu pensei que talvez eu devesse esbarrar em algo, para que Rolf notasse que eu estava chegando. Mas eu percebi que estava sendo um pouco ridícula e corri para seu quarto.

A porta estava aberta, então olhei para dentro do quarto. A luz estava apagada, e estava quase completamente escuro no quarto de Rolf. Estava escuro demais para que até eu não enxergasse claramente. Mas eu podia ouvir a respiração de Rolf, e não era aquela respiração rítmica, previsível de quem está dormindo.

“Rolf?” Eu perguntei, sem muita certeza.

“Nei?” Eu ouvi ele dizer desanimado em algum lugar na escuridão. “Algo errado?”

“Eu ia lhe perguntar o mesmo.” Houve um longo, e incômodo silêncio. “Posso entrar?”

“Claro.” ele respondeu rapidamente. Eu podia ouvi-lo mover-se para a outra ponta da cama. Por um momento eu me perguntei se seria melhor que eu me sentasse perto dele na cama ou no sofá. Mas então eu o ouvi suspirar, e era aquele suspiro trêmulo de quem está muito abalado, e eu não podia suportar deixá-lo sozinho. Me sentei na ponta da cama. Eu pude vê-lo, então. Ele estava sentado, também, com a parte inferior de seu corpo coberta pelos lençóis. Senti minha face enrubescer quando lembrei que Rolf sempre dormia nu. Dei graças por ele não poder me ver tão vermelha.

Ele estava olhando para a janela, mas quando me sentei ele se virou e olhou para mim.

“Você teve outro pesadelo?” Eu perguntei a ele.

Ele confirmou.

Com cuidado, me aproximei mais um pouco. “Quer falar sobre isso?”

“Não há muito o que dizer,” ele disse com uma voz rouca. “Foi o mesmo sonho que venho tendo. Você sabe, o da garota lutando contra um monstro. E toda vez que acordo, eu… eu tenho essa sensação horrível…” Ele levou a face às mãos.

Me aproximei mais de Rolf e pus meu braço em volta dele. Ele pôs sua cabeça em meu ombro, e eu podia sentir o cheiro do shampoo que ele usava e um pouco da colônia do dia anterior.

“Oh, Nei,” ele suspirou. “O quê está acontecendo comigo?”

Ele tocou minha mão e só então percebi que eu alisava seu rosto. Considerando o quanto ele trabalhava todos dias, eu me perguntava como ele podia ter mãos tão suaves. Ele as abaixou, e pude perceber que sua mente havia mudado de foco.

“Nei,” ele disse mais alto e subitamente mais forte do que antes.

Eu congelei, e apenas depois de alguns tensos segundos pude responder, “Sim?”

Ele se posicionou melhor. Mesmo no escuro, eu podia sentir seus olhos entrarem bem no fundo de meu ser. “Por quê você veio aqui?”

Eu comecei a suar. Com dificuldade eu respondi, “Bem, eu, eu ouvi um barulho, e lembrei dos pesadelos que você vem tendo, e pensei que–”

“Nei.” Sua voz era suave, tranquila. “Seja sincera, por quê você veio até aqui?”

Eu me virei, agora ficando muito vermelha. “Rolf, eu já lhe disse.”

Seu braço estava em volta de mim, e ele acariciava gentilmente minha orelha direita. “Está tudo bem, Nei,” ele sussurrou. “Eu sei.”

“Sabe de quê?”

“Você sabe.”

E eu sabia. Eu sabia há muito tempo, muito antes que Rolf pudesse saber. Eu soube desde o primeiro dia, quando eu ainda era pequena e tinha o corpo de uma criança e a mente de um animal. Eu soube desde a primeira vez em que o vi, quando ele se pôs entre eu e aquelas pessoas que me apedrejavam nas ruas de Paseo. Havia algo nele que me dizia que Rolf seria um amigo, e que eu poderia confiar nele, mesmo antes que eu pudesse compreender o que confiança e amizade eram. Eu fui subitamente tomada por lembranças daquelas primeiras semanas. Eu dormia na cama de Rolf na época, encolhida ao lado dele em um pijama felpudo como um animal assustado totalmente dependente de seu mestre. E conforme minha mente se desenvolvia e se tornava a de uma garota normal, eu passei a ver Rolf como um pai, e então como um irmão. E então houve uma noite, depois de eu ter passado meses com Rolf, em que eu observei dormir, esse homem nu que era tudo o que eu tinha e que eu amava, e o amor que eu sentia por ele se transformou em algo diferente, e eu não conseguia mais ficar naquele quarto por temer o que poderia acontecer. Rolf ficou feliz, e disse que isso era porque eu estava crescendo. Se ao menos ele soubesse o quanto.

Mas ele finalmente percebeu. E apesar de eu já conhecer bem meus sentimentos há muito tempo, de alguma forma era Rolf que estava mais preparado. Por mais que eu o amasse, e por mais que eu o quisesse, eu sabia que havia uma parte de mim que sempre seria um animal, e que essa parte jamais permitiria que eu fosse mais do que um biomonstro, e isso não seria bom o suficiente para Rolf. Eu não ousei explicar isso a ele, mas eu sentia e sabia disso, e por isso eu me afastei dele e me sentei sozinha na borda da cama.

Eu sabia que ele ficaria confuso, e ferido, e eu me sentia ainda pior já que meu intuito era o de confortá-lo.

Ele ficou lá sentado, parado e em silêncio, por um bom tempo, antes que finalmente me perguntasse, “Nei, o que há?”

Quando eu demorei para responder, ele perguntou, “Eu estava errado? Oh, Nei, me desculpe.”

“Rolf, é que–”

“Me desculpe, me desculpe…”

“Rolf, está… está tudo bem. Mesmo.”

Eu me virei para encará-lo novamente. Ele ainda estava lá sentado, com sua face agora iluminada pelas luzes da cidade que nunca dormia. Ele me pareceu tão belo naquele momento, e eu sabia que ele estava pensando no quanto eu parecia bela para ele também.“

“Você vai ter um dia cheio amanhã,” Eu disse, me levantando e fechando ainda mais o meu roupão. “Estou certa de que o governador vai lhe delegar uma tarefa tremendamente importante. Deve ser importante, se ele decidiu chamar seu melhor agente.”

Eu ouvi Rolf rir enquanto eu me aproximava dele. Ele olhou para mim, e eu olhei para ele, e algo precioso que não precisava de palavras passou entre nós. Talvez ele soubesse como eu me sentia, desde o início.

Eu o beijei na testa e sorri para ele, que retribuiu. Então eu gentilmente o deitei de volta na cama, cobri-o com seus lençóis de carbono, e dei boa noite. Eu fiquei sentada olhando para ele até que ele dormisse, como ele costumava fazer comigo nas primeiras noites que passei no lar de um estranho. E enquanto eu me preparava para ir dormir, decidi que Rolf não viajaria sozinho, nem amanhã nem nunca, e me pus a pensar em como eu poderia algum dia recompensá-lo por tudo.

Fin

fanworks/fanfictions/fic-021.1230918630.txt.gz · Última modificação: 2009/01/13 11:58 (edição externa)

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